Ignacy Sachs sugere as bases para um novo contrato social
Fernanda B. Müller
Instituto CarbonoBrasil
Em um diálogo envolvendo oficiais das Nações Unidas e do governo brasileiro, o economista e sociólogo Ignacy Sachs se destacou detalhando o que seria necessário para a construção de um novo caminho para a humanidade.
No evento de lançamento do projeto "Novo Contrato Social para o Século XXI", organizado pelo Instituto Ethos e o Instituto das Nações Unidas para Treinamento e Pesquisa (UNITAR), participaram Rajendra Pachauri, vencedor do Prêmio Nobel da Paz em 2007; o embaixador André Corrêa do Lago, negociador-chefe do Brasil para mudança do clima e para a Rio+20; Achim Steiner, secretário adjunto da ONU e diretor-executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente; Carlos Lopes, diretor executivo da UNITAR e Ignacy Sachs, economista e sociólogo.
Sachs deu um Viva a crise, justificando que ela nos ajuda a mudar de rumo, papel que a Rio +20 deveria fazer.
Se referindo à tese de Adam Smith sobre o funcionamento do mercado, ele disse não acreditar muito na mão invisível, porém que o maior problema é saber o que fazer com os cinco dedos da “mão visível”.
O primeiro dedo, seria a construção de um futuro baseado em um contrato social explícito, no nível de cada pais, com a ambição de construir também um “mega contrato social planetário”, utilizando as Nações Unidas para costurá-lo e levá-lo em frente.
“Isto implica em superar as diferenças sociais abissais que permanecem hoje na maioria dos países, o que separa hoje alguns países mais avançados de outros que estão na base da pirâmide. Superar estas diferenças abissais, este é o nosso objetivo”.
Para Sachs, o segundo dedo seria o planejamento participativo, com o objetivo principal de “fazer com que os que estão embaixo da pirâmide possam ser erguidos a um nível que lhes assegure uma vida decente”.
“Os mercados têm a vista curta e a pele grossa, preocupam-se com o imediato e não contabilizam os custos sociais. Precisamos pautar as nossas ações numa visão de longo prazo para evitar catástrofes”, ressaltou.
O terceiro seria a segurança alimentar remetendo à necessidade de se colocar em pauta a questão das reformas agrárias e considerar também a revolução azul, a da água.
A segurança energética seria o quarto pilar para um planejamento com condições de propor soluções validas, notou Sachs, citando a necessidade de uma estratégia gradual de saída das energias fósseis e mantendo distância do uso excessivo da energia nuclear. “O que nos remete a um enorme capitulo de energias renováveis”, conclui.
O quinto dedo seria a cooperação internacional. Sachs sugere soluções para o financiamento de um fundo para ações voltadas ao desenvolvimento sustentável, como o repasse de 1% do PIB dos países ricos, impostos sobre as emissões de dióxido de carbono e taxas sobre o uso do espaço aéreo e marinho para o transporte. Outra medida seria reorganizar a cooperação técnica, “utilizando a geografia dos biomas, estabelecendo uma cooperação entre países que compartem o mesmo bioma”.
Alinhado com as discussões realizadas na Cúpula dos Povos, Sachs conclui que “não são novas formas que devemos procurar e sim novos conteúdos”.
“É perigoso pintar de verde e dizer que mudou, esse debate deve focar nos conteúdos por que pode haver formas plurais de chegar ao mesmo resultado...Temos que propor linhas de ação e olhar se tem mudança de conteúdo e não só declaração de amor a natureza”, alertou.
Após Sachs focar parte das suas propostas na redução das desigualdades, Carlos Lopes também enfatizou que no mundo atual este de fato é um dos maiores problemas.
Rio +20
O debate para um novo contrato social foi programado para o sábado, propositalmente posterior ao término da Rio +20 para poder ser construído a partir de suas bases.
Em uma avaliação crítica dos resultados da conferência no Rio, Achim Steiner comparou o documento final a um livro de culinária com muitos ingredientes, mas sem receitas completas.
“A declaração tem muitos ingredientes, mas, em várias questões que aborda, seu modo de fazer deixa a desejar”, afirmou, acrescentando: “Ainda assim, como nos livros de receita, o documento tem informações suficientes para colocarmos a mão na massa e continuarmos a busca por um novo contrato social, um novo modelo de desenvolvimento”.
Carlos Lopes demonstra um ponto de vista mais otimista calcando no fato que os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, cujo prazo é 2015, foram negociados durante anos para, finalmente, se ter dois parágrafos adotados em 2010 em Johanesburgo e apesar disso, enfatiza, muito já se fez para o seu alcance.
“Não fico admirado do progresso não ser assim tão rápido quanto queremos”, conclui Lopes.
Para Pachauri, a dificuldade em progredir não está na aceitação de nas novas ideais, mas sim em fugir das velhas.
“Chegou a hora do conhecimento se tornar o maior indutor das ações”, ressaltou concordando com a proposta de Sachs de se criar uma taxa pelo uso dos bem globais comuns. “A herança é de todos, mas parece não pertencer a ninguém”, lamentou.
Durante as discussões finais, Oded Grajew, fundador da Abrinq, do Instituto Ethos e do Movimento Nossa São Paulo, constatou que outro grande entrave está na desconfiança da sociedade em relação aos governos.
“Há um ceticismo muito grande das relações entre governos, um exemplo é que dos cinco membros permanentes do conselho de segurança da ONU, apenas um dos presidentes esteve aqui (no Rio). A primeira ministra da Alemanha estava vibrando no futebol enquanto isso”, criticou.
Ele reenfatizou que o debate fundamental na construção de um novo contrato social é o combate a desigualdade, pois apenas à pobreza “é insuficiente”.
“Mesmo em países onde não há pobreza há conflitos. Para sermos seres com convicções parecidas é importante um novo contrato”, comentou. Além disso, este processo tem que ser resolvido sem violência, completa Grajew.
“Os cinco membros permanentes do conselho de segurança da ONU são os grandes vendedores de armas do mundo”, alerta.
O ultimo fator importante em seu ponto de vista seria o fator intergeracional, ou seja, deixar um mundo melhor para as futuras gerações.
“Os governo não representam mais as pessoas e sim os interesses de quem tem mais poder. Se o contrato de 92 (Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992, também no Rio de Janeiro) for pra ser ratificado, que até agora não foi, precisamos de um movimento civil, a sociedade precisa ser reintegrada no processo”, concluiu.
(Fonte: Site do Fórum Século XXI)