sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

AS REFORMAS DO PAPA FRANCISCO


As 24 virtudes necessárias para voltar ao essencial na Igreja

Das "doenças curiais" às "virtudes necessárias". Francisco se encontra com os chefes de dicastério para os votos de Natal e faz uma referência indireta ao Vatileaks 2: a reforma seguirá em frente com determinação. Os escândalos não podem esconder "a eficiência dos serviços que a Cúria Romana, com dedicação, presta ao papa e a toda a Igreja". É preciso "voltar ao essencial": no catálogo das características exigidas daqueles que prestam serviço do outro lado do Rio Tibre, estão a exemplaridade, a fidelidade, a honestidade, a maturidade, a humildade, a confiabilidade e a sobriedade.
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no sítio Vatican Insider, com informações de Stefania Falasca, do jornal Avvenire, 21-12-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"A reforma seguirá em frente com vigor, lucidez e determinação." Mas os escândalos não poderão ofuscar a importância do trabalho que a Cúria Romana, "com dedicação, presta ao papa e a toda a Igreja". Francisco disse isso na manhã de hoje, no tradicional discurso para os votos de Natal à Cúria, na Sala Clementina.
Bergoglio, que no ano passado tinha pronunciado um forte discurso, listando as "doenças" que podem afetar "todo cristão, Cúria, comunidade, congregação, paróquia e movimento eclesial" e que "requerem prevenção, vigilância, cuidado e, infelizmente, em alguns casos, intervenções dolorosas e prolongadas", neste ano ofereceu um catálogo positivo das virtudes necessárias para aqueles que trabalham na Cúria.
No seu discurso, o papa lembrou que algumas das doenças denunciadas em dezembro de 2014 "se manifestaram durante este ano, causando muita dor em todo o corpo e ferindo muitas almas". Uma referência que inclui o casoVatileaks, mas também outros fatos.
"Parece necessário afirmar que isso foi e sempre será – garante Francisco – objeto de sincera reflexão e decisivos procedimentos. A reforma seguirá em frente com determinação, lucidez e resolução, porque Ecclesia semper reformanda".
No entanto, especifica o pontífice, "até mesmo os escândalos não poderão esconder a eficiência dos serviços que aCúria Romana, com esforço, com responsabilidade, com empenho e dedicação presta ao papa e a toda a Igreja, e isso é uma verdadeira consolação".
Por isso, explica, "seria uma grande injustiça não expressar uma profunda gratidão e um necessário encorajamento a todas as pessoas sãs e honestas que trabalham com dedicação, devoção, fidelidade e profissionalidade".
Francisco ressalta que "as resistências, as fadigas e as quedas" também são "ocasiões de crescimento e nunca de desencorajamento", uma oportunidade para "voltar ao essencial", ou seja, para "fazer as contas com a consciência que temos de nós mesmos, de Deus, do próximo, do sensus Ecclesiae e do sensus fidei".
Portanto, no Ano da Misericórdia, o papa propõe um "subsídio prático", um "catálogo das virtudes necessárias" para quem "presta serviço na Cúria" e para todos aqueles que querem "tornar fértil o seu serviço à Igreja", convidando os chefes de dicastério "a enriquecer e a completá-lo". É uma ''análise acróstica" da palavra "m-i-s-e-r-i-c-ó-r-d-i-a", "como fazia Matteo Ricci na China".
O "catálogo das virtudes" se articula, assim, em torno das 12 letras que a compõem:
  • Missionariedade e pastoralidade
  • Idoneidade e sagacidade
  • Spiritualità [espiritualidade] e humanidade
  • Exemplaridade e fidelidade
  • Racionalidade e amabilidade
  • Inocuidade e determinação
  • Caridade e verdade
  • Onestà [honestidade] e maturidade
  • Respeitabilidade e humildade
  • Diviciosidade e atenção
  • Impavidez e prontidão
  • Affidabilità [confiabilidade] e sobriedade
Missionariedade e pastoralidade
A missionariedade "é o que torna e mostra a Cúria fértil e fecunda", enquanto "a pastoralidade sã é uma virtude indispensável especialmente para todo sacerdote", e "a medida da nossa atividade curial e sacerdotal". E "sem essas duas asas – diz o papa – nunca poderemos voar, nem mesmo alcançar a bem-aventurança do 'servo fiel'".
Idoneidade e sagacidade
A primeira "requer o esforço pessoal de adquirir os requisitos" para "exercer da melhor forma possível as próprias tarefas e atividades, com o intelecto e a intuição". E "é contra as recomendações e os subornos". A sagacidade é "a prontidão de espírito para enfrentar as situações com sabedoria e criatividade". Idoneidade e sagacidade representam "o comportamento do discípulo que se volta ao Senhor todos os dias".
Spiritualità [espiritualidade] e humanidade
A espiritualidade é "a espinha dorsal de qualquer serviço na Igreja e na vida cristã". A humanidade é "aquilo que encarna a veridicidade da nossa fé", aquilo "que nos torna diferentes das máquinas e dos robôs que não sentem e não se comovem. Quando nos é difícil chorar seriamente ou rir apaixonadamente, então começou o nosso declínio e o nosso processo de transformação de 'homens' em outra coisa qualquer". Espiritualidade e humanidade devem ser realizadas inteiramente, continuamente, diariamente.
Exemplaridade e fidelidade
Exemplaridade "para evitar os escândalos que ferem as almas e ameaçam a credibilidade do nosso testemunho". Fidelidade à "nossa consagração, à nossa vocação". Aqui, o papa cita as terríveis palavras de Jesus sobre quem escandaliza os pequenos: seria melhor para ele se jogasse nos abismos. "Quem é fiel no pouco também é fiel no muito; e quem é desonesto no pouco também é desonesto no muito (Lc 16, 10)", e "quem escandaliza mesmo que um só destes pequeninos que creem em mim, seria melhor para ele que lhe fosse suspensa no pescoço uma pedra de um moinho e fosse jogado nos abismos do mar" (Mt 18, 6-7)".
Racionalidade e amabilidade
A primeira "serve para evitar os excessos emotivos"; a segunda, "para evitar os excessos da burocracia e das programações e planejamentos". Todo excesso, observa Francisco, "é índice de algum desequilíbrio".
Inocuidade e determinação
A inocuidade "nos torna cautos no juízo, capazes de nos abster de ações impulsivas e apressadas". A determinação é "agir com vontade resoluta, com visão clara e com obediência a Deus" e só pela lei suprema da salvação das almas.
Caridade e verdade
"Duas virtudes indissolúveis da existência cristã, a tal ponto que a caridade sem verdade se torna ideologia do bonismo destrutivo, e a verdade sem caridade se torna judiciarismo cego."
Onestà [honestidade] e maturidade
A honestidade é "a retidão, a coerência e o agir com sinceridade absoluta com nós mesmos e com Deus". Quem é honesto age retamente mesmo quando não há supervisores ou superiores. "O honesto não teme ser surpreendido, porque não engana nunca quem confia nele." E "nunca domina sobre as pessoas ou sobre as coisas que lhe foram confiadas". Enquanto a maturidade é "a busca de alcançar a harmonia entre as nossas capacidades físicas, psíquicas e espirituais".
Respeitabilidade e humildade
A primeira é dom das pessoas que "buscam sempre demonstrar respeito autêntico aos outros, ao próprio papel, aos superiores e aos subordinados, às práticas, aos papéis, ao sigilo e à confidencialidade". A humildade é a virtude "das pessoas cheias de Deus que, quanto mais crescem em importância, mais cresce nelas a consciência de não serem nada e de não poderem fazer nada sem a graça de Deus".
Diviciosidade [doviziosità] e atenção
Assumindo mais um "neologismo", explica o papa, é inútil "abrir todas as portas santas de todas as basílicas do mundo se a porta do nosso coração está fechada ao amor, se as nossas mãos estão fechadas para dar, se as nossas casas estão fechadas para o hospedar e se as nossas igrejas estão fechadas para acolher. A atenção é cuidar dos detalhes e oferecer o melhor de nós e nunca baixar a guarda sobre os nossos vícios e falhas".
Impavidez e prontidão
Isto é, "não se deixar assustar diante das dificuldades" e "agir com audácia e determinação e sem tepidez". A prontidão é "saber agir com liberdade e agilidade, sem se apegar às coisas materiais temporárias", sem nunca "se deixar pesar acumulando coisas inúteis e fechando-se nos próprios projetos, e sem se deixar dominar pela ambição".
Affidabilità [confiabilidade] e simplicidade
Confiável é "aquele que sabe manter os compromissos com seriedade e fidedignidade quando é observado, mas sobretudo quando se encontra sozinho" e "nunca trai a confiança que lhe foi concedida". A sobriedade é "a capacidade de renunciar ao supérfluo e resistir à lógica consumista dominante". É "olhar o mundo com os olhos de Deus e com o olhar dos pobres e ao lado dos pobres". Sóbria "é uma pessoa essencial em tudo, porque sabe reduzir, recuperar, reciclar, reparar e viver com o sentido da medida".
Francisco concluiu o seu discurso pedindo que seja a "misericórdia que guie os nossos passos, que inspire as nossas reformas, que ilumine as nossas decisões". Que seja ela que "nos ensine quando devemos seguir em frente e quando devemos dar um passo para trás".
E citou uma oração dedicada ao Bem-aventurado Óscar Romero pelo cardeal estadunidense Dearden: "De vez em quando, ajuda-nos dar um passo atrás e ver de longe... Somos operários, não mestres de obras, servidores, não messias".
(Fonte: Site Instituto Humanitas Unisinos)

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