A epifania da criação
Vou indicar aqui no blog, um filme que está em cartaz e que é co-dirigido e co-produzido por um dos
cineastas vivos que eu mais admiro, o alemão, Wim Wenders um dos ícones do Novo
Cinema alemão, ao lado de Werner Herzog e Fassbinder. Wenders realizou vários
clássicos do cinema como “Paris, Texas”, “O amigo americano”, “Estrela
Solitária”, “Asas do desejo”, “Tão longe, tão perto” e tantos mais, entre
documentários, ficções e filmes minimalistas, sempre deixando sua marca de
gênio criativo e pensador atento aos movimentos da vida. Seus filmes são belos
e profundos e, ao mesmo tempo leves, uma vez que não carregam nenhum tipo de
afetação típica de várias produções de cineastas ególatras.
Se o cineasta
é Wim Wenders e o filme, eu disse que está em cartaz, fica fácil saber que eu
estou falando de “O Sal da terra”, uma produção de 2014, que recebeu um Prêmio Especial na mostra Un
Certain Regard em Cannes 2014 e foi o filme de abertura do Festival do Rio do
ano passado e é o filme brasileiro indicado ao Oscar de 2015, como melhor documentário.
O filme é um
retrato, ou melhor, são retratos da obra e da vida desse grande fotógrafo
brasileiro, conhecido em todo o mundo, Sebastião Salgado, nascido em Aimoré,
Minas Gerais, que lutou pelas liberdades democráticas no Brasil, nos anos de
chumbo e acabou tendo que abandonar o país com sua esposa Lélia, com quem fixou
residência na França e de lá viajou para várias partes do mundo, como
economista, a serviço do Banco Mundial. Sua esposa, que era artista, passou a se interessar por arquitetura e para tanto comprou
uma máquina fotográfica da qual Sebastião se apropriou, tomou gosto e resolveu
abandonar o emprego tecnocrata-burguês, no Banco Mundial, para se aventurar na fotografia.
O filme revela que no início da carreira como fotógrafo, Salgado fez fotos
esportivas, propaganda, moda, casamento e até mesmo nus, para conhecer o ofício
e sobreviver. Mas foi somente com o início dos projetos de correr o mundo para
retratar o social que ele encontrou definitivamente o seu caminho e se
celebrizou no mundo da fotografia. No documentário, contemplamos na telona, as
imagens que Salgado eternizou com sua câmera fotográfica e que, os que
visitaram sua exposição que tem percorrido várias galerias, teve oportunidade de ver. Tudo o que se viu nessa sua exposição está no
filme: Comunidades e tribos latino-americanas, indígenas da Nova Guiné, Campos
de Refugiados na Etiópia, África, Amazônia, Garimpo de Serra Pelada... E as
belezas naturais retratadas em seu último projeto “Gêneses”, que revela a
exuberância da criação: pássaros, animais terrestres e marinhos, e os
santuários sagrados de água pura e mata virgem. Soberbos personagens desse
projeto que tem ingredientes de catarse, ou obra testamentária, do fotógrafo que
parece ter acalmado o seu espírito atormentado pelas imagens da degradação
humana e do planeta, com este último trabalho, cujo nome “Gênesis” homenageia a epifania da criação.
O filme foi conduzido com maestria por Wim Wenders e pelo seu
co-diretor, o estreante Juliano Ribeiro Salgado, filho de Sebastião.
Senti falta
das fotografias de mendigos brasileiros, feitas por Salgado e tão criticadas
por moradores de rua e agentes de pastorais sociais de São Paulo, no filme “À
margem da imagem”, do diretor brasileiro Evaldo Mocarzel. Outra ausência sentida em “O Sal da Terra”,
foi a das fotos tiradas por Sebastião no atentado sofrido pelo presidente
norte-americano, Ronald Reagan, em 1981. Mas, essa história do Reagan, segundo Juliano “é muito factual, e qualquer pessoa
poderia ter tirado essa foto”.
E, por falar em Juliano, ele também revela em entrevista, que tem dificuldades de relacionamento com o pai. Parte
dessas dificuldades, ao assistir o filme, inferimos que tenha sido fruto das
grandes ausências de Sebastião Salgado. Outros motivos só a família Salgado
poderá nos revelar. Tem mais curiosidades no filme: mais uma revelação do
jovem Juliano Salgado - que diz ter tido dificuldades também com Wim Wenders, ao
dirigirem o filme a 4 mãos. Como espectadores, no entanto, não vemos isso traduzido
no filme. E, se houve tensão entre os co-diretores, ela só colaborou, no sentido
de que encontrassem as melhores soluções. Assim como a dificuldade de Juliano
com o seu pai, Sebastião, ao meu ver, só ajudou os realizadores a buscar
compreender, de forma menos passional, o ofício e a alma desse homem e artista,
chamado Sebastião Salgado.
Fica aí então
a dica do longa-metragem documental, de 110 minutos, realizado em 2014, uma
co-produção França-Brasil sobre o fotógrafo brasileiro, Sebastião Salgado, dirigido
por Wim Wenders e Juliano Ribeiro Salgado. Não deixe de ver “O Sal da Terra”,
em cartaz nos cinemas do país.
Juliano Ribeiro Salgado, Sebastião Salgado e Wim Wenders
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