terça-feira, 28 de junho de 2016

O QUE PODE ESTAR POR TRÁS DA BREXIT DO REINO UNIDO DA UNIÃO EUROPÉIA


Cameron descarta novo plebiscito 

e negociação para saída da UE começará em outubro

Durante pronunciamento no Parlamento nesta segunda-feira (27), o primeiro-ministro do Reino Unido, David Cameron, descartou a possibilidade de realizar um novo referendo sobre a “Brexit”, a saída britânica da União Europeia, apesar de uma petição popular por uma nova votação ter angariado mais de 3,7 milhões de assinaturas.
“O resultado da votação não foi o que eu queria, mas eu e meu gabinete concordamos que deve ser respeitado”, disse Cameron, que fez campanha pela permanência da região na UE e anunciou sua renúncia do cargo de primeiro-ministro assim que os resultados do referendo foram divulgados, na madrugada da última sexta-feira (24).
“[Um segundo referendo] não está nem remotamente em jogo. O resultado foi decisivo”, reforçou um porta-voz do premiê ao jornal britânico The Independent.
petição online foi criada pela sociedade civil no site do Parlamento britânico na sexta-feira (24), dia seguinte ao referendo, pedindo que o governo realize um novo plebiscito sobre a "Brexit". Até o momento, mais de 3,7 milhões de britânicos subscreveram o pedido. O Parlamento britânico é obrigado a debater os temas propostos pelos cidadãos caso uma petição reúna mais de 100 mil assinaturas.
Sobre as negociações para a saída do bloco, Cameron disse que elas deverão ser lideradas pelo novo premiê, que deve ser eleito em outubro, durante a convenção do Partido Conservador.
Cameron afirmou também em seu pronunciamento que a saída do Reino Unido da União Europeia não provocará mudanças imediatas nos direitos da população e que a economia do país está bem posicionada para “enfrentar os desafios à frente”. Ele também condenou o aumento de ataques racistas e xenófobos após a votação pelo "Brexit" e pediu aos parlamentares fazerem "tudo o que puderem" para frear estes ataques.
Entretanto, Jeremy Corbyn, líder do partido Trabalhista que enfrenta grande oposição por membros de sua legenda, pediu que Cameron comece as negociações assim que ele for para Bruxelas, sede da União Europeia, o que deve acontecer esta semana. “Não podemos ficar em um estado de paralisia pelos próximos três meses”, defendeu.
(Fonte: Site Brasil de Fato)

terça-feira, 21 de junho de 2016

AMEAÇA AO ESTADO DE DIREITO


Bukharin em 37, Moscou: a democracia em 2016, Curitiba


Tarso Genro*



Foto: Ramiro Furquim - Sul 21


Norberto Bobbio, nos “Direitos e Deveres da República”, fala do papel preponderante que o dinheiro assumiu na vida política e mostra que, no regime dos Médici na Florença do Século XV, aquela família não alterou a fachada das instituições republicanas, mas, graças ao dinheiro distribuía favores e fazia amizades, que gestavam os consensos para o exercício da sua dominação política, mesmo sem alterar, formalmente, as regras de exercício do poder. Mais adiante, mostra Bobbio, uma só pessoa na Itália de hoje pode conseguir apoios pelos mesmos meios e, graças à mídia, pode exercer um forte poder ideológico, com severas consequências negativas no jogo democrático. Dinheiro e poder da burocracia alimentam um ao outro, de tal forma que podem neutralizar os sinais da soberania popular, pois – como também ensinava Bobbio – nenhum Estado real se sustenta na virtude dos seus cidadãos, mas nas regras que organizam as suas lutas pelo poder e as lutas pela sobrevivência. 
Integro aquela parte da sociedade e a “parte” dos próprios partidos, que entende que os inquéritos e processos, que visem atacar a corrupção e responsabilizar indivíduos dentro da legalidade do Estado de Direito, devem ser saudados e apoiados. E integro, igualmente, a parte da sociedade que entende que a cidadania deve estar atenta, para combater as deformações das ações do Estado, pelo uso manipulatório dos processos judiciais, seja pelos meios de comunicação oligopolizados, seja por facções de partidos ou de empresas, que escondem suas próprias mazelas, promovendo campanhas falsamente moralizadoras, para prover seus propósitos políticos e interesses econômicos. Qualquer Estado – de legalidade “socialista” ou “capitalista”- tem espaços para flexibilizar, um maior (ou menor) grau de autoritarismo, na sua função de “estado-polícia” e “estado-sancionador”: o que a sua Constituição aponta que está “fora”, ou “dentro” da sua legalidade, é sempre passível de ser maleado pelas contingências da política e da economia. 
Um exemplo clássico desta manipulação – neste momento em que são investigados os líderes dos principais partidos do país – é “misturar”, na informação, as propinas e os financiamentos de “Caixa 2”, com as contribuições legais das empresas aos partidos. Esta “mistura” ajuda os verdadeiros criminosos a se safarem dos processos e desconstitui os processos – enquanto processos penais – transformando-os em meros instrumentos do debate político. Outro exemplo é a consideração das delações premiadas como “meios absolutos” de prova, pois os principais criminosos sempre dirão o que for necessário dizer, para se safarem das penas que lhes esperam, se não “colaborarem” com o Ministério Público. A divulgação destas delações – sem critérios legais – agride o princípio da ampla defesa e pode, mais tarde, anular os processos e beneficiar massivamente, tanto os que não cometeram delitos e foram denunciados levianamente (o que é bom), como os que cometeram crimes contra o Estado (o que é péssimo), assim enfraquecendo a capacidade punitiva do Estado. 
Mas o exemplo mais brutal da perversão do Estado de Direito, no âmbito penal, são os vazamentos seletivos. Os vazamentos seletivos transformam a autonomia dos órgãos de Estado, como a Polícia e o Ministério Público (independentemente da vontade dos seus chefes), em soberania privada: soberania interna aos Poderes Soberanos. Os vazamentos seletivos internalizam, cotidianamente, na máquina estatal, a luta de partidos, que se dá na Sociedade Civil, já que aquelas instituições passam a ser espaços onde os estamentos confrontam. Se eu seleciono de maneira arbitrária, por exemplo, vazar uma informação que pode prejudicar Lula, ou Aécio, ou Marina, colocando-os na defensiva – num determinado tema que está sendo investigando – estou tratando-os de forma desigual, em relação a outras pessoas que não tiveram seus nomes “vazados”, estimulando a plutocracia a promover ações políticas que estão fora do seu dever constitucional. O próximo passo é ela apresentar-se como portadora de um messianismo de “salvação da República”, com o estupro da neutralidade formal do Estado. As publicações seletivas de informação caracterizaram a imprensa soviética e a imprensa nazista, nos períodos dos seus grandes processos administrativos e judiciais, de natureza política, assim partidarizando a Polícia e o Poder Judiciário de forma plena. 
O resultado, aqui no Brasil, num processo que não é idêntico, mas análogo – dentro da democracia política – foi o afastamento de uma Presidenta sem crime e a assunção ao poder de uma Confederação de Investigados e Denunciados, promovida pelo oligopólio da mídia, articulado com a direita política, setores do Ministério Público e dos Juízes, sobre os quais o Estado de Direito “perdeu o controle”.
A “perda do controle”, quer dizer – no caso – que alguns agentes públicos movem-se com desembaraço “fora da legalidade”, não que eles devam ser “controlados” para descumprir as suas funções “dentro da legalidade”. O exemplo mais flagrante desta deformação do Estado de Direito, foi a gravação e a divulgação seletiva, pelo Juiz Moro, da conversa entre a Presidente Dilma e o ex-Presidente Lula, vazamento este celebrado nas ruas com consignas como “Cunha nos representa” e “Sonegação de impostos é legítima defesa”. São os mesmos que agora veem as suas lideranças atingidas por novas delações premiadas, já tidas como “provas absolutas”, pelo campo político que lhe é adverso. A internalização irracional da política, na plutocracia estatal, leva à irracionalidade da política na Sociedade Civil. Perdem a Democracia e o Estado de Direito, já que estas ações do Estado enfraquecem o que nos resta de senso comum republicano. 
Cada tipo de Estado tem as suas formas de exercer o poder e as suas formas de aceitar violações da sua legalidade, mantendo a aparência de respeito aos fundamentos das sua Constituição. Trata-se de uma questão que não está relacionada com a estrutura econômica da sociedade em questão, mas vincula-se aos modos através dos quais, no Estado Moderno, os grupos que detém o poder obtém sucesso, nos seus objetivos nem sempre coerentes com o espírito da sua constituição. Por exemplo, a Constituição de 36, na URSS, não admitia a tortura, bem como a Constituição de 88, no Brasil, não admitia o início do cumprimento de uma pena sem seu trânsito em julgado. Em ambas as hipóteses, todavia, isso foi violado pela coerência de uma burocracia, responsável pelo funcionamento geral do sistema. 
No X Congresso do PCUS (1921), o herege tido como “liberal” Bukharin, involuntariamente começou a preparar as condições de inimizade que no futuro iriam lhe levar à condenação à morte, pela Justiça Soviética. É um episódio muito ilustrativo da burocratização da política, que pode ocorrer em qualquer Estado, independentemente de suas formas de legalidade.
Dizia Bukharin em 1921, com flagrante ironia, para atacar os novos gestores-burocratas do Estado Soviético, originários do Partido, que já começara a ressecar a sua capacidade criativa: “A história da humanidade se divide em três períodos -o matriarcado, o patriarcado e o secretariado”. Lá em março de 1937, quando o aparato estatal soviético já é composto por milhões de burocratas, enquadrados pelo stalinismo (em que pese o presumido Estado de Direito Socialista da Constituição de 1936) Bukharin está respondendo ao Procurador Vishinsky, por suas (inventadas) “atividades de espionagem” e ações “anti-soviéticas”. Era o final dos processos judiciais de natureza politica, que assassinaram toda a velha guarda bolchevique, organizados pelo poder burocrático do “secretariado” no Estado, que tinha no seu centro o “Guia Genial dos Povos”.
Entre 5 e 7 de março, resistindo à fúria condenatória do Procurador Vishinsky, Bukhárin não só mostra-se um mestre em evasivas, mas também confessa-se culpado de todos os crimes que lhe são imputados, “independentemente de conhecê-los ou não”, ou mesmo de ter “participado dos mesmos de forma especial”. Prefere, desta forma, deixar uma mensagem para a História, sobre a ilegalidade completa da sua futura condenação, que já estava definida pela burocracia Judiciária do Estado.
Um dos crimes absurdos, que lhe é imputado, é a tentativa de assassinato de Lenin, falecido de causas naturais há mais de uma década, que teria sido promovido por pessoas que Bukharin sequer conhecia. Quando ele é defrontado com um suposto companheiro de crime, Vladmir Karelin – destruído física e moralmente pelas torturas no inquérito – responde à pergunta do Procurador (sobre se conhecia o presumido coautor) da seguinte forma: “Ele mudou tanto que eu não diria tratar-se do mesmo Karelin”.
Com a falência precoce do Governo interino e com a responsabilização cada vez maior que a mídia vem sofrendo, por ter promovido a ruptura da ordem constitucional do país, esta quer, agora, absolver-se. Trata de “separar-se” do seu Governo golpista e criar uma imagem de neutralidade, a partir da disseminação da tese que o Brasil “não será mais o mesmo”, depois da Lava-jato, o que é inteiramente falso. 
Em primeiro lugar, é preciso ver se a Lava-jato, voltando para os trilhos da legalidade também irá punir os responsáveis pelos vazamentos seletivos, causadores de delações forçadas, que certamente destruirão a vida de pessoas que, no futuro, poderão ser inocentadas. É preciso verificar se os ladrões, que sonegam impostos todos os dias, passarão a ser punidos -dentro da legalidade- com o mesmo correto rigor que estão sendo punidos os políticos corruptos. Se teremos uma reforma política, a proibição de contribuição de empresas a partidos e candidatos. Se vamos democratizar os meios de comunicação e, através da soberania popular recuperada, dotar de nova legitimidade a esfera política democrática. 
Se isso não ocorrer é mera falácia dizer que o Brasil vai “mudar” para melhor, depois da Lava-jato. Ao contrário, a Lava-jato como está -vista como causa do golpismo em curso e abalada pelos vazamentos seletivos na mídia oligopólica- será considerada apenas mais um espasmo de moralismo, fundado em razões justas que foram devidamente anuladas pelas manipulações políticas. Se isso ocorrer, poderemos dizer sobre a democracia, depois da Lava-jato (parodiado Bukharin sobre Karelin): “Esta democracia mudou tanto, que custa crer que seja a mesma da Constituição de 88”. E o grupo de Curitiba, que instaurou uma jurisdição nacional inconstitucional, será então conhecido apenas como um grupo de gestores de uma República do Galeão composta por civis.
 
Tarso Genro foi Governador do Estado do Rio Grande do Sul, prefeito de Porto Alegre, Ministro da Justiça, Ministro da Educação e Ministro das Relações Institucionais do Brasil.

(Fonte: Site Carta Maior)

quinta-feira, 16 de junho de 2016

PAUSA PARA MEDITAÇÃO...


Veredas Crucis


Eugênio Magno



a minha caminhada não pode ser

  reiniciada enquanto não encontrar

                   os calçados adequados

 os antigos ficaram despedaçados

e os meus pés estão em chagas

(Do livro Minas em mim, 2005: 30)

sábado, 11 de junho de 2016

NÃO DEVEMOS SER ANALFABETOS POLÍTICOS


A Igreja deve envolver-se na política”, afirma o Papa Francisco



“Existe o adágio da Iluminismo que a Igreja não deva envolver-se em política, mas a Igreja deve envolver-se na grande política, porque – cito Paulo VI – a política é uma das formas mais altas da caridade”: disse-o o Papa falando no sexta-feira, 03-06-2016, à tarde a uma convenção de magistrados sobre “tratamento de seres humanos e criminalidade organizada”, convidados ao Vaticano pela Academia das Ciências sociais.
“A Igreja – disse ele ainda – deve empenhar-se para ser fiel às pessoas, e ainda mais quando se tocam as chagas e os sofrimentos mais dramáticos”.
Isto, para Francisco, é seguramente o caso do tráfico das pessoas, do narcotráfico, da prostituição, do tráfico de órgãos que eram os temas da convenção que – disse ele – são “crimes contra a humanidade que devem ser reconhecidos como tais por todos os líderes políticos, sociais e religiosos no mundo”.
Bergoglio louvou o empenho de muitos magistrados em perseguir as escravidões modernas: “Sei que sofreis ameaças e condicionamentos de tantas partes. Sei que hoje ser procuradores, ser ministros públicos é arriscar a vida e isto me faz ser reconhecido da coragem de alguns de vós que querem ir em frente, permanecendo livres. Sem esta liberdade, o poder judiciário se corrompe e gera corrupção”.
O que está em curso no Vaticano é a terceira convenção sobre o tema: são encontros desejados pessoalmente por Francisco, porque tráfico de vidas e corrupção são “os maiores males da humanidade”.
(Fonte: Centro Nacional de Fé e Política Dom Helder Câmara - CEFEP-DF)

domingo, 5 de junho de 2016

HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO


A educação no coração do Império: 
convite à leitura de um livro inexistente
Em 2014 a professora Mirian Warde, uma de nossas maiores referências no estudo da história da educação brasileira, reuniu um conjunto significativo de textos sobre a história da educação nos EUA com o propósito de organizar um livro sobre o assunto. No entanto, depois de tudo pronto, ela não encontrou editora que se dispusesse a publicar o livro, apesar de seu ineditismo. Diante disso, a professora organizou dois dossiês para revisas nacionais. Um deles saiu na Revista História da Educação e o outro sairá, em breve, nos Cadernos de História da Educação. Para o livro que seria publicado, ela pediu-me um Prefácio. É a este prefácio jamais publicado que o leitor do Pensar a Educação em Pauta tem acesso neste momento.
O livro é, certamente, a mais desconcertante e inusitada obra lançada na área de educação, no Brasil, nos últimos anos. Afinal, como explicar, dentro da mais recente tradição pedagógica e, porque não, política, que vicejam no campo educacional brasileiro, a publicação de um livro que trata da história da educação nos Estados Unidos da América?
Para sentir apenas um "gostinho", do que pode ser a leitura desse livro, fique com a epígrafe do prefácio, de autoria do professor da Faculdade de Educação, da UFMG, Luciano Mendes de Faria Filho.
“Pensamento
Da Igualdade – como se me incomodasse dar aos outros as mesmas oportunidades e direitos que tenho, como se para os meus próprios direitos não fosse indispensável que todos tivessem os mesmos”. (Walt Whitman. Folhas de relva. Ed. Civilização Brasileira, 1964, p.128)
epígrafe do prefácio, de autoria do professor da Faculdade de Educação, da UFMG, Luciano Mendes de Faria Filho.

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quarta-feira, 1 de junho de 2016

DE NOVO NÃO...


Livro "Resistência ao golpe de 2016" 
nasce movido à indignação



Denise Assis


O livro “Resistência ao Golpe de 2016” foi organizado por acadêmicos, jornalistas, cientistas políticos, advogados e líderes de movimentos sociais, que, ao longo da crise, se reuniam para trocar idéias e textos que escreveram. Alguns desses textos foram publicados em blogs, outros poucos em jornais. Participam 100 autores.
A coletânea foi organizada pela coordenadora do Programa de Doutorado em Direito da PUC-Rio, Gisele Cittadino, pela professora de Direito Internacional da UFRJ, Carol Proner, pelo advogado Marcio Tenebaun e o advogado trabalhista Wilson Ramos Filho, foi lançado na última terça-feira, dia 31 de maio. 
Alguns autores foram convidados, como o acadêmico da Universidade de Coimbra,  Boaventura de Souza Santos, um dos idealizadores do Fórum Social Mundial, e o cientista polítco, Wanderley Guilherme dos Santos. O deputado federal Wadih Damous consta do livro, bem como o deputado Paulo Pimenta.
À medida que a crise se instalava a discussão em torno do tema ficava mais animada e frequente. Wilson Ramos foi quem teve a iniciativa de reunir os textos em livro. Recolheu o material produzido pelo grupo e assim nasceu o compilado de 450 páginas. 


Tudo começou quando no dia 4 de março o ex-presidente, Lula da Silva, foi buscado em casa sob forte aparato, por uma operação da Polícia Federal, e conduzido para uma sala especial do Aeroporto de Congonhas, onde foi ouvido coercitivamente. Daquele momento em diante,  ninguém mais teve dúvidas. Era o golpe se instalando. Os que viveram tempos sombrios sentiram no ar o cheiro de enxofre. E para quê esperar mais? Quem pôde, em todas as capitais, saiu às ruas, para demonstrar que não, não seria assim, de bandeja. 
Por sorte de Lula e nossa, estava no aeroporto o ministro do Supremo Tribunal de Justiça, Marco Aurélio Mello, que impediu que o ex-presidente fosse seqüestrado para Curitiba, conforme revelou depois. Na pista, um avião da Força Aérea Brasileira já o aguardava, de porta aberta, esperando apenas que cochilássemos, para levá-lo espalhafatosamente para Curitiba, onde desceria preso.
Para os que viveram a ditadura, os sinais eram fortes demais para cruzarmos os braços. Para os que não viveram, mas já ouviram de sobra sobre os seus efeitos - que até hoje reverberam na sociedade, vide o desaparecimento de Amarildo – o quadro que se desenhava era muito característico para ser ignorado.
E foi assim, num sem fim de telefonemas, encontros e reuniões, que fomos passando do estado de perplexidade ao espanto, e do espanto à indignação. Daí vieram os atos, as mobilizações, até que nos vimos difamados mundo a fora, com aquele espetáculo deplorável do dia 17 de abril, quando os deputados, qual freqüentadores do programa da Xuxa, mandavam “um beijo pra mamãe, pro papai e pra você”, votando pelo início do processo de impeachment. Una forma grotesca de maquiar o que o mundo chamou de golpe. Isto, sem falar na ode ao torturador, uma afronta aos mortos e desaparecidos na luta pela redemocratização desse país. 
Foi pensando nesse processo que tantas vidas nos custou, tanto sacrifício, tantos picos de inflação galopante, tantos anos em que os salários nada valiam, e conseguir um emprego era quase um prêmio, que o grupo se uniu para usar a arma que tínhamos às mãos. O teclado dos computadores. 
 Naquele momento, era preciso literalmente botar a boca no mundo e gritar aos quatro ventos, como reagiu Chico Buarque, no Largo da Carioca, em ato no dia 31 de março: “Não, de novo não. Não vai ter golpe”. Passamos todos, cada um ao seu estilo, e correndo em raia própria, a denunciar a quebra da institucionalidade democrática que está ocorrendo no Brasil.
Escrevemos. Incansavelmente escrevemos. Denunciamos. Mas diante dos oligopólios da mídia, da vulnerabilidade de um Congresso minado pela corrupção doentia e digna de uma aprofundada investigação, e um Supremo - com honrosas exceções - acumpliciado com os que jogavam abertamente com o presidente do Congresso, Eduardo Cunha, não houve como salvar um modelo de país que tanto nos custou a ser delineado e construído. Um modelo que incluiu mulheres, negros, índios, foi rapidamente varrido para debaixo do tapete onde hoje pisam Temer e sua turma. Interinamente. É bom que se diga.
(Fonte: Site Carta Maior)